O Brasil continua mostrando sua vocação para a fruticultura, principalmente com a expansão de tecnologia nas regiões do Nordeste do País. Cidades, como Petrolina (PE) e Juazeiro (BA), hoje centros de um pólo formado por mais de seis municípios, se constituem em verdadeiros “paraísos” de desenvolvimento do Semi-árido brasileiro.
O exemplo destas regiões só contribuiu para o surgimento de outros pólos que também passaram a investir “pesado” em tecnologia. Na região do Sudeste, por exemplo, mais exatamente no Noroeste Paulista isto já é uma realidade e bastante lucrativa. E lá, que se concentra a maior produção de citros do País. Atualmente, a citricultura no Estado é a segunda maior atividade rural representada em alguns municípios até como base total da economia, de acordo com os dados do Fundecitrus (Fundo de Defesa da Citricultura). Segundo informações do Instituto Brasileiro de Frutas (IBRAF), cerca de 850 mil toneladas de frutas saíram do País em 2004, número que cresceu 5% em relação a 2003 e que fez o setor frutífero alcançar o recorde nas exportações.
Mas, qual é a tecnologia usada para alcançar tantas conquistas? “A gente não vê. E debaixo da terra que há quilômetros de tubulações e encanamentos. Eles são ligados a emissores, chamados microaspersores ou gotejadores, que distribuem água somente na zona radicular das cultura. Deles, simultaneamente a água e os adubos químicos chegam ao solo na quantidade necessária para cada planta. É a chamada fertirrigação”, explica o professor de Agronomia e coordenador da Área de Hidráulica e Irrigação da Unesp Ilha Solteira, Fernando Braz Tangerino Hernandez.
“A ocorrência de períodos de estiagem prolongados com altas temperaturas, que provocam índices de evapotranspiração acentuados, justifica os crescentes investimentos em sistemas de irrigação com fertirrigação, principalmente, no Noroeste e Oeste paulistas”, conta.
Segundo os produtores adeptos desta tecnologia, a fertirrigação é simplesmente efetuada pela adição de pequenas quantidades de fertilizantes durante todo o período de crescimento e manutenção da cultura, diminuindo a lavagem dos fertilizantes além da zona radicular, comum na adubação convencional, mantendo níveis ideais de nutrientes no solo que dissolvido em água é facilmente absorvido pelas plantas. Além da alta produtividade, apontam os especialistas no assunto, a cultura fertirrigada tem a vantagem de produzir durante o ano todo. Isto permite uma oferta de frutas de forma mais homogênea durante o ano, reduzindo a necessidade do armazenamento do fruto para a entressafra, os custos da adoção de fertilizantes, equipamentos e mão-de-obra.
“Na verdade, o citricultor não descobriu somente a vantagem de contar com um manejo adequado, mais de um sistema que lhe garante um trabalho completo, ou seja, otimizando os meios de produção”, lembra o professor.
De acordo com o gerente de Operações e Controle da IRRIGATERRA, empresa especializada em sistema de irrigação, e engenheiro agrônomo Mauro Suzuki, para se ter um trabalho completo tudo dependerá de conhecimentos técnicos, projeto específico e adequado para cada situação de solo, topografia, clima, qualidade de água e cultivo. “É necessário garantir ao produtor o retorno do seu investimento e a satisfação ao irrigante”, afirma o gerente de operações e controle da IRRIGATERRA, Mauro Suzuki.
Dosagem Certa
Não importa o tamanho da propriedade, do pequeno ao grande produtor, a irrigação hoje associada a fertirrigação é um investimento que traz bons resultados, garantem os técnicos da área. De acordo os produtores, o custo de energia elétrica é ainda um grande empecilho na hora de investir no sistema, mas em contrapartida, a resposta é positiva, já que a tecnologia pode até dobrar a produção, como foi o caso do citricultor Reinaldo Caritá, dono do Sítio Santa Emília, em Itápolis, São Paulo.
Desde 2002, o proprietário faz uso da fertirrigação. Antes de o projeto ser implantado na área, a produção de laranja estava comprometida, a fruta murchava e impossibilitava a colheita, apesar dos pés estarem carregados. “Com o sistema o sucesso foi imediato deu para aproveitar tudo. Só com o rendimento daquele ano, paguei o investimento do projeto”, ressalta o produtor, que fala com orgulho da plantação, que hoje conta com a fertirrigação por gotejamento vaso a vaso.
Na verdade, o projeto além de ajudar o Sr. Caritá na antecipação da produção assegurou também ao citricultor sair na frente no mercado garantindo um preço melhor para suas laranjas. “A fruta depende de água para florar e nesta época tivemos um período de grande de seca na região. Como irrigava e adubava meu pomar estou hoje com a safra adiantada uns dois meses e posso vender a fruta a um bom preço. Tudo isso devido ao investimento feito em tecnologia”, esclarece.
Contente com a vantagem que o projeto tem proporcionado, Sr. Reinaldo ressalta com vaidade que na sua propriedade, anos atrás uma planta produzia uma caixa e, neste ano, produzirá no mínimo duas ou até três caixas de frutas de qualidades viçosas. “Foi o melhor investimento que já fiz até agora. Além de dobrar a produção, o pomar passou a ter outra vida”, afirma o citricultor que possui sete mil pés de laranja. “Mesmo em tempos difíceis, onde os produtores estão economizando, o conselho é investir. Quem não adotar tecnologia está fora do mercado que hoje procura muito mais qualidade ‘do que’ quantidade”, conta.
O produtor e engenheiro agrônomo Fábio Del Rovere também cultiva laranja com irrigação na região de Itápolis. Há três anos parte do pomar passou a contar com a fertirrigação por gotejamento, que libera 19,7 metros cúbicos de água por hora. Através do sistema, Del Rovere conseguiu obter uma produtividade média de 3,8 caixas por planta. Antes a média, era de 1,4 caixa por pé. “Todo mundo que conhece sabe que são necessários 275 frutos para encher uma caixa 40,8 quilos e, graças ao sistema usei 226 frutos. Outra vantagem está relacionada à adubação e aplicação de defensivos. Só de adubo, sem contar maquinaria, implemento e mão-de-obra, houve uma economia de 30% em relação ao que gastava com adubo sólido”, afirma o produtor, que conta com o projeto de fertirrigação nos 11 hectares do sítio que produz atualmente diversas variedades de citros.
“Além disso, antes de utilizar a fertirrigação era necessário uma semana e meia para adubar o pomar. Cinco dias por semana e oito horas por dia. Usava trator, o tratorista e mais uma pessoa para ajudar na adubação”, afirma o produtor Fábio Del Rovere. Hoje, ele mantém um funcionário treinado que inicia o processo de fertirrigação com hora marcada. Para monitorar a necessidade da área de plantio, Del Rovere utiliza tensiômetro, um equipamento formado por dois tubos de PVC, lacrados na ponta por cápsulas de gesso, enterrados em diferentes profundidades no pomar. Cada tubo é completado por água e recebe uma pequena mangueira, cuja outra extremidade entra em um frasco com mercúrio, formando vasos comunicantes. A medida em que ocorre perda de água no solo, o nível de mercúrio sobe na mangueira. A partir de um determinado nível, deve ser iniciada a irrigação, associada com a necessidade de fertilizantes.
Doses Homeopáticas
A utilização de água como veículo para aplicar fertilizantes nas culturas é relativamente antiga. Há centenas de anos, o lançamento de esterco animal em canais de irrigação já era praticado. Devido ao desenvolvimento das técnicas, associado às vantagens como economia de mão-de-obra e energia, possibilidade de aplicar fertilizantes em qualquer fase do ciclo da cultura e maior eficiência na aplicação, a indução de fertilizantes via água de irrigação tornou-se uma prática comum em países onde a agricultura irrigada é mais desenvolvida.
No Brasil, o ganho de produção em decorrência do uso da fertirrigação já vem sendo observado. Na busca por uma maior eficiência e precisão têm aumentado o uso da automação em sistemas de fertirrigação. Para isto, são utilizadas válvulas solenóides ou acionadas hidraulicamente, que são abertas e fechadas automaticamente através de comandos previamente estabelecidos em microprocessadores e temporizadores (controladores de irrigação), flexibilizando as freqüências, horários e durações das aplicações de água e fertilizantes, otimizando o sistema de acordo com as necessidades específicas de cada caso.
Resultado
Com o sistema, a planta recebe diariamente os nutrientes necessários para se tornar uma árvore fortalecida resistente a pragas, doenças e a todos os agentes patógenos, além de reduzir o prazo de produção, seja no desenvolvimento da muda, como também no futuro desta, na época da colheita. “Vejo a irrigação como uma tecnologia muito importante não só para a citricultura como qualquer atividade agrícola”, comenta o professor Fernando Braz Tangerino Hernandez.
“Em tempo de chuva é a melhor hora para investir em projetos de irrigação, assim no período de seca, de estiagem, o produtor rural tem nas mãos o controle de sua produção. E o pomar não sofre estresse”, afirma o produtor Fábio Del Rovere.
O custo de um sistema de irrigação depende do modelo a ser implantado (pivô central, canhão, microaspersão ou gotejamento) e da cultura que será irrigada, mas pode variar entre R$ 2 mil a R$ 6 mil por hectare. No caso da citricultura, a implantação de irrigação custa cerca de R$ 4,5 mil por hectare e permite uma resposta muito rápida com redução nas perdas por abortamento da florada e de chumbinhos. Uma conseqüência direta da falta de água é fácil de ser constatada na colheita. Devido ao estresse hídrico, são necessárias muito mais frutas para encher uma caixa padrão (com 40,8 quilos). De acordo com o gerente de Controle da IRRIGATERRA, Mauro Suzuki, o uso de dois meses consecutivos de irrigação permite incremento de 20% a 25% na produção do pomar. Além disso, na citricultura, a irrigação aliada aos fertilizantes ajuda na indução da florada. Sem dúvida, é a tecnologia a serviço do homem.
FÁTIMA COSTA, Revista Rural, agosto de 2005, Número 90.