Entrevista com o engenheiro Antônio José Tavares Ranzani – diretor do DAEE Turvo/Grande

06/04/2005

O Engenheiro Ranzani em entrevista ao INFORME IRRIGATERRA Número 3 esclarece dúvidas sobre o uso da água, o processo de Outorga ea atuação do DAEE na região da Bacia Hidrográfica do Turvo/Grande.

O Engenheiro Antônio José Tavares Ranzani formou-se na Universidade de Brasília – UnB em 1973; iniciando nesse mesmo ano sua trajetória profissional no Departamento de Águas e Energia Elétrica – DAEE em São Paulo. Assumiu (1977-1986) a Diretoria de Serviços e Obras de São José do Rio Preto. Participou ativamente da implantação do Comitê de Bacia Hidrográfica do Turvo/Grande(1995), sendo um dos responsáveis pela implantação do Centro de Gerenciamento de Recursos Hídricos – TGR e da nova Diretoria de Bacia Turvo/Grande do DAEE (1996). Desde abril de 2002 é o Diretor da Diretoria de Bacia Turvo/Grande do DAEE, com sede em São José do Rio Preto e responsável pelo atendimento a 89 municípios da região. É também o Secretário Executivo do Comitê de Bacia Hidrográfica do Turvo/Grande (CBH-TG) e do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio São José dos Dourados (CBH-SJD).

Quais são as atribuições do DAEE e quais as principais ações da sua Diretoria?
O DAEE é uma Autarquia da Secretaria de Energia, Recursos Hídricos e Saneamento do Estado de São Paulo, que tem como sua principal atividade o gerenciamento planejado dos usos de Recursos Hídricos no Estado. A nossa Diretoria exerce esse gerenciamento inspecionando, fiscalizando, orientando e instruindo processos de solicitações de Outorga de Direito de Usos de Recursos Hídricos. Também faz atendimento aos municípios cedendo máquinas e equipamentos para combate às enchentes, erosão, obras de proteção aos recursos hídricos, etc. e ainda oferece apoio aos Comitês de Bacias TG e SJD , sendo responsável pela Secretaria Executiva e Agente Técnico desses dois Comitês) .

Quais foram até agora os principais desafios enfrentados por sua equipe?
Com uma pequena equipe, temos a missão de fazer o atendimento, orientação e fiscalização, melhorar a qualidade dos recursos hídricos e colaborar com o desenvolvimento da nossa região. Manter a qualidade dos nossos serviços, a nossa credibilidade perante a opinião pública, tendo em vista as nossas deficiências estruturais é o nosso maior desafio.

Qual a situação do noroeste paulista em termos de disponibilidade e qualidade da água para irrigação?
Na nossa região é muito baixa a média anual de precipitação pluviométrica e como conseqüência temos a mais baixa disponibilidade hídrica superficial do Estado, e em função disso temos alguns problemas com a oferta de água para a irrigação. Temos alguns mananciais que estão em estado crítico, isto é, a água é retirada além da capacidade mínima do rio. Quanto à qualidade, temos também problemas pontuais, porque em algumas localidades, os esgotos domésticos são lançados diretamente nos rios sem o devido tratamento.

O Senhor acredita que a região noroeste do Estado de São Paulo pode se tornar menos competitiva em termos de produção agrícola devido à concorrência pela água entre a agricultura, a indústria e o consumo humano?
Não acredito. Se cuidarmos direito dos nossos recursos hídricos, não teremos esse problema de competitividade pelo fato de sermos uma região essencialmente agrícola, termos boas terras, bom clima, conseqüentemente boa produção. Não temos grandes indústrias e para o consumo humano temos a opção do abastecimento através de captação de água subterrânea, de boa qualidade, em quantidade e de fácil acesso. Vejo a agricultura de um modo estável na nossa região, mas repito: se cuidarmos bem da nossa água.

Uma nova preocupação veio somar-se às muitas que o produtor rural já possui: A OUTORGA. Pode esclarecer-nos o que é?
A Outorga é uma autorização, concedida pelo DAEE, que assegura ao usuário o direito de usar a água num determinado local, num corpo d’água, com vazão, tempo e finalidade definidas. A outorga não é uma preocupação e sim um instrumento de controle e gerenciamento dos recursos hídricos.

Por que a necessidade da outorga?
É através da outorga que se conhece o usuário e as características do uso da água, isto é, temos um cadastro que possibilita uma melhor distribuição da água num determinado corpo d’água. Isto é gerenciamento de recursos hídricos.

Todos os produtores que, de uma forma ou outra, utilizam-se de água, superficial (córrego /rio /açude) ou subterrânea (poço semi-artesiano) estão sujeitos à obtenção da outorga?
Sim, todos aqueles que fizerem uso ou interferência nos recursos hídricos (superficiais ou subterrâneos) estão sujeitos a obtenção da outorga.

Há alguma exceção?
Sim, há. Atualmente somente usuários de água subterrânea cujo consumo seja inferior a 5 m³/dia, cuja finalidade seja para uso doméstico/sanitário estão dispensados da outorga, porém devem apresentar análise de potabilidade para fazerem uso da água e serem cadastrados no DAEE. Existe na legislação a dispensa de outorga para usos insignificantes, cujo valor deve ser determinado pelo Estado de comum acordo com o Comitê de Bacia, mas isso ainda não foi feito, tendo em vista a necessidade de estudos, cadastros, parâmetros e etc..

Como a obrigatoriedade da outorga ajuda a regular a captação de água?
No pedido de Outorga analisa-se a quantidade solicitada, a localização, a existência de outros usuários, conhecem-se as características de uma captação num determinado corpo d’água, com isso realiza-se uma melhor distribuição deste recurso.

Como se obtém a outorga?
Nossos técnicos passam orientações aos usuários de como devem proceder para a obtenção da outorga. Preenche-se e protocola-se um requerimento específico para cada tipo de uso, na Diretoria do DAEE onde se localiza o uso (no nosso caso o requerimento pode ser protocolado na Diretoria de Serviços de Jales ou na Diretoria Regional de São José do Rio Preto). Essa documentação é analisada e não havendo ajustes e complementações a serem feitas, ela é encaminhada às instâncias superiores para a finalização da Outorga e publicação no Diário Oficial do Estado.

A outorga pode ser conseguida pelo próprio usuário da água ou é necessário um profissional responsável? Quem estaria habilitado para isso?
A outorga é requerida pelo usuário, com a apresentação de um projeto elaborado por um técnico responsável, devidamente autorizado pelo CREA.

Ainda no caso da outorga do uso da água, existe a possibilidade da simplificação de procedimentos e documentação para projetos de irrigação de pequeno porte?
Existe através do Programa de Apoio ao Irrigante – PAI, que foi estabelecido através de um acordo entre Secretarias de Estado. À Secretaria de Agricultura ficou a parte técnica, isentando o usuário com gastos para elaboração de projeto e ART. À nossa Secretaria, coube ao DAEE agilizar todo esse processo.

Duas reclamações dos postulantes à outorga são recorrentes: excessiva demora na concessão da outorga e tarifas incompatíveis com os rendimentos do produtor requerente. Pior quando se destina a instruir processo de financiamento. O que se pode fazer para minimizar esse problema?
A excessiva demora deve-se a alguns fatos. As documentações e dados incompletos apresentados nos projetos nos obrigam a enviar correspondência aos usuários e efetuar as devidas correções, o que demanda tempo. Aliado a tudo isso temos deficiência na nossa estrutura organizacional. Temos expectativas de que essa situação deve melhorar. Quanto às tarifas, que são apenas para cobrir despesas de tramitação e publicação dos processos de outorga, acredito que não são tão elevadas se comparadas às tarifas de outros órgãos. As tarifas para irrigação são as menores quando comparadas às de outros usos constantes do nosso quadro de emolumentos. Quanto aos financiamentos, hoje por exigência da Federação dos Bancos, todo financiamento que envolva usos de recursos hídricos, bem como aquisições de equipamentos para irrigação devem vir acompanhadas da Outorga. Isto é uma segurança para os Bancos que estão financiando equipamentos adequados àquela irrigação, com o conhecimento da disponibilidade de água adequada para aquele empreendimento.

Como autoridade diretamente ligada ao uso da água, como o senhor vê a atuação das empresas de irrigação na agropecuária?
Sei que existem muitas empresas de irrigação que passam informações errôneas aos seus clientes, talvez até por falta de conhecimento. Ao meu ver as empresas, de um modo geral, deveriam consultar mais o DAEE, estreitar mais esse relacionamento, para passar uma melhor orientação.

Muitos irrigantes continuam captando água dos rios sem outorga. Enquanto alguns desconhecem a obrigatoriedade desse documento, outros alegam que não há fiscalização e, portanto, não se preocupam em obtê-lo. Como o senhor vê esta questão?
Realmente a nossa fiscalização é deficitária, mas o maior interessado na obtenção da Outorga deveria ser o próprio usuário. Só para exemplificar, com a outorga ele tem a segurança do fornecimento de água para o seu empreendimento, está legalizado perante a legislação vigente e pode ter acesso a financiamentos bancários, e como desvantagem em não ter a outorga, não tem autorização para o uso da água, está cometendo uma infração, não conhece sua disponibilidade hídrica, e não tem acesso a financiamentos bancários, impedindo desta forma que o DAEE faça um melhor gerenciamento do uso da água.

De que forma os Comitês de Bacia Hidrográfica podem ajudar a agricultura irrigada?
O Comitê tem desenvolvido e financiado programas de educação ambiental, em especial na agricultura. Tem também financiado projetos na zona rural tais como: terraceamentos, conservação de estradas municipais, entre outros.

O que o DAEE pode fazer para facilitar o trabalho das empresas de irrigação e a vida dos irrigantes?
As empresas deveriam estreitar o relacionamento com o DAEE para serem melhor informadas sobre os usos de recursos hídricos, de forma que seus clientes seriam corretamente orientados.

O senhor acredita que a cobrança pelo uso da água na agricultura seria uma maneira de racionalizar seu uso?
Sem duvida, tudo que onera nosso bolso, pensamos duas vezes antes de gastar. Com a cobrança, se gastarmos água sem critérios, estaremos jogando dinheiro fora. A cobrança já é um projeto de lei, faltando apenas a sua aprovação na Assembléia Legislativa do Estado. Como a agricultura no nosso país é bastante sacrificada, não acredito que a cobrança venha onerar esse setor, principalmente na nossa região que é essencialmente agrícola.

Quais as principais causas do desperdício de água na irrigação?
Tradicionalmente temos a falsa idéia de abundância de água e daí praticamos a cultura do desperdício. Necessitamos de uma forte educação ambiental e capacitação, objetivando melhorar as técnicas de irrigação com equipamentos adequados. Por outro lado, muitas vezes por desconhecimento, falta interesse do próprio produtor.

Que mensagem o senhor deixa aos usuários da água e, especialmente, aos irrigantes?
O gerenciamento promovido pelo DAEE, diferentemente do que pensam alguns usuários de água, só vem para orientar, organizar e disciplinar o uso da água. Temos uma equipe técnica nessa área que, apesar de pequena, é muito atuante, muito eficiente, capaz e apta a analisar e prestar todas as informações necessárias para a obtenção da Outorga de Uso dos Recursos Hídricos. Almejamos um mesmo ideal, que é melhorar cada vez mais o nosso meio ambiente, as nossas condições de vida. Portanto, recomendamos que solicitem as suas outorgas, adquiram os seus direitos de Uso dos Recursos Hídricos, legalizem-se, para que possamos realizar uma melhor distribuição da água, um melhor gerenciamento. O Comitê de Bacias Hidrográficas estabelece a política de gestão dos Recursos Hídricos na nossa Bacia Hidrográfica, isto é, nós que determinamos o que queremos fazer com a água na nossa Bacia. Cuidar do meio ambiente sob todos aspectos é um dever de todos.

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